As causas e condições do golpe militar de
1964 foram os seguintes: a radicalização da “política de massas”
promovida pelo populismo de esquerda e a mobilização popular que a
acompanhava; a reação conservadora das elites e das Forças Armadas
contra o governo de João Goulart; a redução do crescimento
econômico e o descontrole da inflação; a pressão externa dos
Estados Unidos a favor da conspiração em nome da “segurança”
do hemisfério ocidental no contexto da guerra fria.
O
general Humberto Castelo Branco foi o primeiro presidente do regime
militar de 1964. Durante seu governo (1964-1967) começou a enxurrada
de decretos, leis, Atos Institucionais e Emendas
Constitucionais:
Ato Institucional n° 1 (10/04/64) –
autorizava a cassação de mandatos e a suspensão de direitos
políticos de parlamentares, governadores, funcionários públicos e
líderes sindicais, além dos ex-presidentes Jânio Quadros, João
Goulart e Juscelino Kubitschek. Determinou também a eleição
indireta para a Presidência da República.
Ato Institucional
n° 2 (27/10/65) – dissolveu os partidos políticos existentes e
criou o bipartidarismo. Surgiu, um partido do governo – a Aliança
Renovadora Nacional (ARENA) – e outro de oposição, o Movimento
Democrático Brasileiro (MDB).
Lei de Imprensa (9/2/67) –
impôs restrições à liberdade dos meios de comunicação,
sobretudo aos jornais e revistas, prevendo ainda o direito a censura
prévia a livros, revistas e espetáculos.
No
plano econômico, o governo Castelo Branco anunciou um programa
econômico denominado PAEG (Plano de Ação Econômica do Governo), a
fim de combater a inflação, estimular as exportações e
desestimular as importações. O Paeg alcançou vários objetivos com
a redução da inflação e a recuperação das exportações
agrícolas.
Resistência
E Repressão
Em
março de 1967, tomou posse o segundo presidente militar, o general
Artur da Costa e Silva (1967-1969). Durante o seu governo, cresceu no
país a reação ao regime militar, mobilizando diversos setores
sociais e políticos no Brasil.
Formou-se
ainda em 1966 a Frente Ampla, com Carlos Lacerda, ex-governador do
estado da Guanabara (hoje Rio de Janeiro), que se aliou com os
ex-presidentes João Goulart e Juscelino Kubitschek e parte do MDB,
que almejavam preparar um bloco de resistência liberal-democrático.
Contudo, a Frente Ampla não conseguiu a trair o apoio da população
e acabou se extinguindo.
Na
verdade, a mobilização popular de expressão contra o regime seria
o movimento estudantil. Liderados por dirigentes da União Nacional
dos Estudantes (UNE), que atuava na clandestinidade, os estudantes
promoviam manifestações e comícios em todas as grandes cidades do
país.
No dia 27 de Outubro de 1964, o Congresso Nacional já
havia extinguido a UNE e todas as uniões de estudantes estaduais,
aprovando a Lei Suplicy.
O
auge dos protestos estudantis se deram a partir da morte do estudante
paraense Edson Luís de Lima Souto assassinado pela Polícia Militar
em 28 de março de 1968 durante um confronto no restaurante
Calabouço, centro do Rio de Janeiro. Edson foi o primeiro estudante
assassinado pela Ditadura Militar e sua morte marcou o início de um
ano turbulento de intensas mobilizações contra o regime militar.
Marcha Dos Cem Mil |
Centenas
de cartazes foram colados na Cinelândia com frases como "Bala
mata fome?", "Os velhos no poder, os jovens no caixão"
e "Mataram um estudante. E se fosse seu filho?".
Em
26 de junho ocorre a Passeata dos Cem Mil, uma manifestação de
protesto, em consequência da morte do estudante secundarista Edson
Luís. A manifestação reuniu mais de cem mil pessoas, no centro da
cidade do Rio de Janeiro, na zona conhecida como Cinelândia, o que
representou um dos mais significativos protestos no período
ditatorial do Brasil.
A
música popular também foi utilizada para propagar a resistência contra o regime militar. Na década de 60, os festivais de música
popular da TV Record, de São Paulo, serviram como veículo para
expressar a indignação dos artistas contra a opressão imposta pela
ditadura. É dessa época a música “Pra não dizer que não falei
de flores”, mais conhecida como “Caminhando”, de Geraldo
Vandré, que se tornou um hino de contestação e mobilização
contra o regime militar, juntamente com o samba “Apesar de você”,
de Chico Buarque de Holanda.
Caminhando
tornando-se um hino de resistência contra o governo militar foi
censurada. O Refrão “Vem,
vamos embora / Que esperar não é saber / Quem sabe faz a hora, /
Não espera acontecer”
foi interpretado como uma chamada à luta armada contra os ditadores.
“Apesar
de você” é uma canção escrita e originalmente interpretada por
Chico Buarque de Hollanda, em 1970 , no exílio em Roma. A canção,
por implicitamente lidar com a questão da falta de liberdade durante
a época da ditadura militar, foi proibida de ser executada pelas
rádios no Brasil pelo governo Médici.
Hoje você é quem manda
Falou, tá faladoNão tem discussão, não.A minha gente hoje andaFalando de lado e olhando pro chão.Viu?Você que inventou esse EstadoInventou de inventarToda escuridãoVocê que inventou o pecadoEsqueceu-se de inventar o perdão.(Coro)
Apesar de você
amanhã há de ser outro dia.Eu pergunto a você onde vai se esconderDa enorme euforia?Como vai proibirQuando o galo insistir em cantar?(Letra de “Apesar de você”, de Chico Buarque de Holanda, 1970.)
A
Guerrilha Urbana
Setores
radicais de esquerda começaram a atacar o governo com ações
clandestinas armadas, como assaltos a bancos, sequestro de diplomatas
e atentados contra autoridades e unidades militares.
Uma
das primeiras organizações a pegarem em armas contra a ditadura foi
a Ação Libertadora Nacional (ALN), uma organização revolucionária
comunista brasileira de oposição ao regime militar, surgida no fim
de 1967, com a expulsão de Carlos Marighella do Partido Comunista do
Brasil (ex-PCB). A ALN tinha a proposta de uma ação objetiva e
imediata contra a ditadura militar, defendendo a luta armada e a
guerrilha como instrumento de ação política.
Além
da ALN, houve na guerrilha urbana, a VAR-Palmares e o MR-8. A
Vanguarda Armada Revolucionária Palmares (VAR-Palmares) foi uma
organização brasileira de esquerda que combateu o regime militar.
Surgiu em julho de 1969, como resultado da fusão do Comando de
Libertação Nacional (Colina) com a Vanguarda Popular Revolucionária
(VPR) de Carlos Lamarca.
O Movimento Revolucionário 8 de
Outubro (MR8) foi uma organização brasileira de esquerda, com
orientação marxista-leninista, que participou do combate armado à
Ditadura no Brasil. Seu nome rememora a data em que o guerrilheiro
argentino Che Guevara foi capturado pela CIA na Bolívia.
As
principais ações da guerrilha urbana no Brasil de 1968 a 1970
foram: o assalto ao trem pagador da ferrovia Santos-Jundiaí
(10/6/1968), pela ALN; o ataque ao QG do II Exército (26/6/1968),
pela VPR; o roubo do cofre de Adhemar de Barros (11/5/1969), contendo
pouco mais de 2,8 milhões de dólares, em espécie, o equivalente a
16,2 milhões de dólares de 2007, pela VAR-Palmares; o assassinato
do capitão do Exército dos Estados Unidos e suposto agente da CIA
Charles Rodney Chandler (12/10/1969), pela VPR; o sequestro do embaixador norte-americano Charles Burke Elbrick (4/9/1969), pela ALN
e o MR-8.
A
maioria dos guerrilheiros eram estudantes, com idade média de 23
anos, que haviam se mobilizados nas ruas em 1968. Boa parte havia
abandonado as universidades. De cada dez ações de guerrilha, oito
buscavam dinheiro, armas, papéis de identidade. As ações mais
ofensivas, como os sequestros de diplomatas, destinavam-se a tirar
gente da cadeia ou do país.
A
destruição das organizações armadas começou em 1969, a partir da
organização das atividades de policia política dentro do Exército.
No final de 1970, todas as organizações da guerrilha urbana estavam
desestruturadas.
A
Guerrilha No Campo
No
campo, a mobilização guerrilheira teve sua maior expressão com a
Guerrilha do Araguaia. A Guerrilha do Araguaia foi um conjunto de
operações guerrilheiras ocorridas durante a década de 1970. O
movimento foi organizado pelo Partido Comunista do Brasil (PCdoB),
oriundo de uma cisão no PCB. Os integrantes do PCdoB pretendiam
combater o governo militar e implementar o comunismo no Brasil,
iniciando o movimento pelo campo.
Área De Atuação Da Guerrilha No Araguaia |
Os
guerrilheiros eram em sua maioria estudantes, professores e
profissionais liberais. Os militantes do PCdoB começaram a chegar na
região a partir do final da década de 1960. Oriundos do sul e
sudeste, eram chamados de “paulistas”.
Estima-se
que participaram em torno de setenta a oitenta guerrilheiros sendo
que, destes, a maior parte se dirigiu àquela região em torno de
1970. Entre eles, estavam Osvaldo Orlando Costa (o “Osvaldão”),
o médico João Carlos Haas Sobrinho, a estudante de biologia da
Universidade Federal Fluminense Cristina Moroni de 21 anos, Maria
Célia Corrêa, 26 anos, estudante da Faculdade Nacional de
Filosofia, além do ex-presidente do Partido dos Trabalhadores (PT),
José Genoíno, que foi detido pelo Exército em 1972.
Os
guerrilheiros se estabeleceram em uma região onde os estados de
Goiás, Pará e Maranhão faziam fronteira, às margens do rio
Araguaia-Tocantins, próximo às cidades de São Geraldo e Marabá no
Pará e de Xambioá, no norte de Goiás (região onde atualmente é o
norte do Estado de Tocantins, também denominada como Bico do
Papagaio).
Logo,
procuraram se integrar às comunidades locais. Para isso, faziam seus
roçados, montavam farmácias e, de acordo com suas habilidades,
ajudavam em partos, faziam cirurgia e dedicavam-se a alfabetização
da população local.
Os
guerrilheiros criaram a ULDP (União pela Liberdade e pelos Direitos
do Povo), onde discutiam as reivindicações de interesse dos
moradores locais, sobretudo questões relacionadas à grilagem e
repressão, estimulando a consciência política da população e
buscando apoio para a guerrilha. Também se organizaram militarmente
com a formação das FORGAs (Forças Guerrilheiras do Araguaia),
promovendo treinamentos e ações de guerrilha.
O
Exército Brasileiro descobriu a localização do núcleo
guerrilheiro em 1971 e fez três investidas contra os rebeldes. Os
guerrilheiros, surpreendidos, se refugiaram armados na floresta. As
operações de guerrilha iniciaram-se efetivamente em 1972, tendo
oferecido resistência até março de 1974.
Em
1972, no primeiro choque com a guerrilha, uma tropa do Exército foi
desbaratada. Em 5 de maio, outra tropa foi desbaratada pela
guerrilha, um tenente foi ferido e o cabo Odílio Cruz Rosa, da 5ª
Companhia de Guardas de Belém foi morto. A guerrilha também atacou
uma base do 2° Batalhão de Infantaria de Selva e matou o sargento
Mário Abrahim da Silva.
Em
janeiro de 1975 as operações foram consideradas oficialmente
encerradas com a morte ou detenção da maioria dos guerrilheiros.
Em
1976 ocorreu a chamada Chacina da Lapa quando foram executados os
últimos dirigentes históricos do PCdoB.
Os
Anos De Chumbo
A
repressão da ditadura militar contra qualquer ofensiva contrária ao
regime começa a ser instituída desde a eclosão do golpe. Em Junho
de 1964, foi criado o Serviço Nacional de Informações (SNI), onde
eram catalogados e fichados aqueles que eram considerados inimigos do
Estado, que eram considerados perigosos à Segurança Nacional. O SNI
coordenava e catalogava todas as informações que poderiam ser
relevantes: cidadãos e suas ações eram rastreadas, grampeadas,
fotografadas.
Diante
da ofensiva estudantil e guerrilheira a reação da ditadura foi
endurecer a repressão, sobretudo durante os governos dos presidentes
Costa e Silva (1967-1969) e Emílio Garrastazu Médici (1969-1974).
Em
13 de Dezembro de 1968, o Presidente Costa e Silva decretou, mandou
publicar e cumprir o Ato Institucional Número 5 (o AI-5). Dava-se
início aos anos de chumbo.
Pelo
disposto no ato, os militares tinham o direito de decretar o recesso
do Congresso, das Assembleias Legislativas e Câmaras Municipais.
Foi retirada toda a estabilidade e independência do Poder
Judiciário, pois o Executivo poderia mandar suspender habeas-corpus
sob a acusação de crime político contra qualquer cidadão em
qualquer momento. A cassação de direitos políticos poderia ser
decretada com extrema rapidez e sem burocracia, o direito de defesa
ampla ao acusado foi eliminado, suspeitos poderiam ter sua prisão
decretada imediatamente, sem necessidade de ordem judicial, os
direitos políticos do cidadão comum foram cancelados e os direitos
individuais foram eliminados pela instituição do desacato à
autoridade.
Além
do AI-5, outras medidas foram tomadas como:
Criação das
Áreas de Segurança Nacional (1968): municípios brasileiros,
inclusive as capitais estaduais, foram declarados “áreas de
segurança nacional”, perdendo sua autonomia e passando a ter
prefeitos nomeados pelo governo federal.
Ato Institucional n°
14 (1969): determinava a pena de morte ou a prisão perpétua para os
crimes da “guerra revolucionária e subversiva”.
Emenda
Constitucional n° 2 (1972): estabelecia eleições indiretas para os
governadores estaduais.
Criação do Colégio Eleitoral
(1973): órgão destinado a eleger o presidente da República.
Foram
também ampliados em nível nacional os aparelhos policiais e
militares de repressão, centrados nos DOI-CODIs. Os CODIs eram os
Centros de Operação de Defesa Interna, sendo órgãos de
planejamento das ações de defesa. Os DOIs eram os destacamentos de
operações de informações surgidos a partir de 1970 no Rio de
Janeiro, São Paulo, Recife, Belém, Brasília, etc. Seus
destacamentos faziam as investigações, buscavam informações e
realizavam a busca e apreensão. Os DOIs faziam o trabalho sujo:
prisão, interrogatório, tortura e assassinato.
O
tenente e torturador Marcelo Paixão de Belo Horizonte de 1968 a
1971, descreve o método de tortura utilizado:
“A primeira coisa era jogar o sujeito no meio de uma sala, tirar a roupa dele e começar a gritar para ele entregar o ponto (lugar marcado para encontros) e os militantes do grupo. Era o primeiro estágio. Se ele resistisse, tinha um segundo estágio, que era mais porrada. Uma dava tapa na cara. Outro, soco na boca do estômago. Se não falava, tinha dois caminhos. Dependia muito de quem aplicava a tortura. Eu gostava muito de aplicar a palmatória. É muito doloroso, mas faz o sujeito falar. (...) Você manda o sujeito abrir a mão. O pior é que, de tão desmoralizado, ele abre. Aí se aplicam dez, quinze bolos na mão dele com força. A mão fica roxa. Ele fala. A etapa seguinte era o famoso telefone das Forças Armadas. (...) É uma corrente de baixa amperagem e alta voltagem. (...) Eu gostava muito de ligar nas duas pontas dos dedos. Pode ligar numa mão e na orelha, mas sempre do mesmo lado do corpo. O sujeito fica arrasado. O que não pode fazer é deixar a corrente passar pelo coração. Aí mata. (...) O último estágio em que cheguei foi o pau-de-arara com choque. Isso era para o queixo-duro, o cara que não abria nas etapas anteriores.”(Entrevista de Marcelo Paixão de Araújo a Alexandre Oltramari, revista Veja, 9 de dezembro de 1998. pp. 42-53.)(Entrevista de Marcelo Paixão de Araújo a Alexandre Oltramari, revista Veja, 9 de dezembro de 1998. pp. 42-53.)
A
ditadura estimulou também a ação de grupos paramilitares de
direita, reunindo civis, policiais e militares, como os Comandos de
Caça aos Comunistas (CCCs) e os Esquadrões da Morte, que realizavam
atentados contra teatros, igrejas, sindicatos, órgãos de imprensa,
etc.
No
dia 18 de Julho de 1968 integrantes do Comando de Caça aos
Comunistas (CCC) invadem o Teatro Ruth Escobar, em São Paulo,
espancam o elenco da peça Roda Viva.
Em 1969, diversos
artistas, como Chico Buarque de Holanda, Caetano Veloso e Geraldo
Vandré sofrem pressões políticas e são obrigados a deixar o
país.
Com
a assinatura do AI-5, a censura a imprensa tornou-se implacável. O
jornal O
Estado de São Paulo teve
por diversas vezes seu prédio invadido e suas máquinas para
produzir seus jornais paradas por chefes da Polícia Federal. O
Jornal do Brasil teve um de seus diretores preso, o embaixador José
Sette Câmara, ex-governador do estado da Guanabara.
A
censura não permitia que nenhum jornal divulgasse notícias sobre
recessão econômica e financeira ou sobre atos terroristas,
preparação de guerrilhas, movimentos operários, greves, explosão
de bombas, assaltos a bancos, roubo de armas, etc.
O
jornal semanário de vanguarda O Pasquim
sofreu
atentados a bombas e chegou a ter toda a sua redação presa. Outro
semanário, o Opinião
teve
cerca de 5 mil publicações vetadas pela censura. Seu diretor,
Fernando Gasparian foi detido, e explodiu-se uma bomba em sua sede.
Uma
das ações mais marcantes da repressão da ditadura foi a morte do
jornalista Vladimir Herzog, em 25 de outubro de 1975. Diretor de
jornalismo da TV Cultura de São Paulo, Herzog foi acusado de
pertencer ao PCB. Apresentando-se voluntariamente no DOI-CODI de São
Paulo, foi encontrado morto em uma das celas do órgão, enforcado
com seu próprio cinto. Ninguém acredita na versão oficial de
suicídio.
Corpo De Herzog No DOI-CODI |
Fonte: Blog Nova História
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